João Guimarães
Rosa (Cordisburgo, 27 de julho de 1908 — Rio de Janeiro, 19 de novembro de 1967),
foi um dos mais importantes escritores brasileiros de todos os tempos. Foi também médico e diplomata.
Os contos e romances escritos por Guimarães Rosa
ambientam-se quase todos no chamado sertão brasileiro. A sua obra destaca-se,
sobretudo, pelas inovações de linguagem, sendo marcada pela influência de
falares populares e regionais que, somados à erudição do autor, permitiu a
criação de inúmeros vocábulos a partir de arcaísmos e palavras populares,
invenções e intervenções semânticas e sintáticas .
Foi o primeiro
dos seis filhos de Florduardo Pinto Rosa ("Flor") e de Francisca
Guimarães Rosa ("Chiquitita"). Começou ainda criança a estudar
diversos idiomas, iniciando pelo francês quando ainda não tinha 7 anos, como se
pode verificar neste trecho de entrevista concedido a uma prima, anos mais
tarde:
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“
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Eu
falo: português, alemão, francês, inglês, espanhol, italiano, esperanto, um pouco de russo; leio: sueco, holandês, latim e grego (mas com o dicionário agarrado);
entendo alguns dialetos alemães; estudei a gramática: dohúngaro, do árabe, do sânscrito, do lituano, do polonês, do tupi, do hebraico, do japonês, do checo, do finlandês,
do dinamarquês;
bisbilhotei um pouco a respeito de outras. Mas tudo mal. E acho que estudar o
espírito e o mecanismo de outras línguas ajuda muito à compreensão mais
profunda do idioma nacional. Principalmente, porém, estudando-se por
divertimento, gosto e distração.
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”
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Ainda pequeno,
mudou-se para a casa dos avós, em Belo Horizonte, onde concluiu o curso
primário. Iniciou o curso secundário no Colégio Santo Antônio, em São João del-Rei,
mas logo retornou a Belo Horizonte, onde se formou. Em 1925,
matriculou-se na então "Faculdade de Medicina da Universidade de Minas
Gerais", com apenas 16 anos . Em 27 de junho de 1930,
casou-se com Lígia Cabral Pena, de apenas 16 anos, com quem teve duas filhas:
Vilma e Agnes. Ainda nesse ano se formou e passou a exercer a profissão em Itaguara, então município de Itaúna (MG), onde permaneceu cerca de dois anos. Foi
nessa localidade que passou a ter contato com os elementos do sertão que serviram de referência e
inspiração a sua obra. Flamengo De volta de Itaguara,
Guimarães Rosa serviu como médico voluntário da Força Pública (atual Polícia
Militar), durante a Revolução
Constitucionalista de 1932, indo para o setor do Túnel em Passa-Quatro (MG) onde tomou contato com
o futuro presidente Juscelino Kubitschek,
naquela ocasião o médico-chefe do Hospital de Sangue. Posteriormente, entrou
para o quadro da Força Pública, por concurso. Em 1933,
foi para Barbacena na qualidade de Oficial Médico
do 9º Batalhão de Infantaria. Aprovado em concurso para o Itamaraty, passou alguns anos de sua vida como
diplomata na Europa e na América Latina. No início da carreira
diplomática, exerceu, como primeira função no exterior, o cargo de
Cônsul-adjunto do Brasil em Hamburgo, na Alemanha, de 1938 a 1942.
No contexto da Segunda Guerra
Mundial, para auxiliar judeus a fugir para o Brasil, emitiu, ao
lado da segunda esposa, Aracy de
Carvalho Guimarães Rosa, mais vistos do que as cotas legalmente
estipuladas, tendo, por essa ação humanitária e de coragem, ganhado, no
pós-Guerra, o reconhecimento do Estado de Israel. Aracy é a única mulher
homenageada no Jardim dos Justos entre as Nações, no Yad Vashemque é o memorial oficial de Israel para lembrar as vitimas judaicas do Holocausto. No Brasil, em sua segunda
candidatura para a Academia
Brasileira de Letras, foi eleito por unanimidade (1963).
Temendo ser tomado por uma forte emoção, adiou a cerimônia de posse por quatro
anos. Em seu discurso, quando enfim decidiu assumir a cadeira da Academia, em 1967,
chegou a afirmar, em tom de despedida, como se soubesse o que se passaria ao
entardecer do domingo seguinte: "…a gente morre é para provar que
viveu." Faleceu três dias mais tarde na cidade do Rio de Janeiro,
em 19 de novembro.
Se o laudo médico atestou um infarto, sua morte
permanece um mistério inexplicável, sobretudo por estar previamente anunciada
em sua obra mais marcante — Grande Sertão:
Veredas —, romance qualificado por Rosa como uma
"autobiografia irracional". Talvez a explicação esteja na
própria travessia simbólica do rio e do sertão de
Riobaldo, ou no amor inexplicável por Diadorim, maravilhoso demais e terrível
demais, beleza e medo ao mesmo tempo, ser e não-ser, verdade e mentira.
Diadorim-Mediador, a alma que se perde na consumação do pacto com a linguagem e a poesia. Riobaldo (Rosa-IO-bardo), o poeta-guerreiro que, em
estado de transe, dá à luz obras-primas da literatura universal. Biografia e
ficção se fundem e se confundem nas páginas enigmáticas de João Guimarães Rosa,
desaparecido prematuramente aos 59 anos de idade, no ápice de sua carreira
literária e diplomática. flamengo x Fluminense
Realismo mágico, regionalismo, liberdades e invenções
linguísticas e neologismos são
algumas das características fundamentais da literatura de Guimarães Rosa, mas não as
suficientes para explicar seu sucesso. Guimarães Rosa prova o quão importante é
ter a linguagem a serviço da temática, e vice-versa, uma potencializando a
outra. Nesse sentido, o escritor mineiro inaugura uma metamorfose no
regionalismo brasileiro que o traria de novo ao centro da ficção brasileira .
Guimarães Rosa
também seria incluído no cânone internacional a partir do boom da
literatura latino-americano pós-1950. O romance entrara em decadência nos Estados Unidos (onde à época era vitrine
da própria arte literária, concorrendo apenas com o cinema), especialmente após
a morte de Céline (1951), Thomas Mann (1955), Albert Camus (1960), Hemingway (1961), Faulkner (1962). E, a partir de Cem
anos de solidão (1967), do colombiano Gabriel García
Márquez, a ficção latino-americana torna-se a representação de uma
vitalidade artística e de uma capacidade de invenção ficcional que pareciam,
naquele momento, perdidas para sempre. São desse período os imortais Mario Vargas Llosa (Peru), Carlos Fuentes (México), Julio Cortázar (Argentina), Juan Rulfo (México), Alejo Carpentier (Cuba)
e mais recentemente Angel Ramá (Uruguai).
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1936: Magma
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1946: Sagarana
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1947: Com o Vaqueiro
Mariano
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1956: Corpo de Baile
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1956: Grande Sertão:
Veredas
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1962: Primeiras Estórias
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1964: Campo Geral
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1965: Noites do Sertão
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1967: Tutaméia –
Terceiras Estórias
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1969: Estas Estórias (póstumo)
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1970: Ave, Palavra (póstumo)
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2011: Antes das
Primeiras Estórias (póstumo)
Academia
Brasileira de Letras
É o terceiro
ocupante da cadeira 2, eleito em 6 de agosto de 1963,
na sucessão de João Neves da
Fontoura e recebido pelo acadêmico Afonso
Arinos de Melo Franco em 16 de novembro de 1967.